Entre os castelos do Diabo e dos Condes em Gent

Saindo da Sint Baafskathedraal e finalmente do pedaço das Três Torres que prende bastante a gente, rs, decidi fazer uma caminhada até o Gravensteen, porque fiquei bastante curiosa ao ver sua torre do alto do Belfry.

Mas antes resolvi passar por outro castelo, o Geeraard de Duivelsteen.
O castelo foi construído no século 13 e recebeu esse nome por causa do cavaleiro Geeraard Vilain, nascido em uma família de viscondes que orgulhosamente se auto intitulavam de Senhores de Gent.

Enfim, o cavaleiro em questão era conhecido como “Geeraard de Duivel” que significa “Geerard, o Diabo”. Um nome de dar inveja ao Conde Vlad Dracul, mas que na verdade era por causa da cor escura do seu cabelo e de sua pele.

Apesar do nome e sua aparência sombria, o diabo mesmo nunca morou nesta fortaleza que, ao longo dos séculos seguintes, acabou sendo usada para diversos fins como residência de cavaleiros, arsenal, mosteiro, escola e seminário do bispo. Em 1623, chegou a se tornar um hospício para doentes mentais e lar para meninos órfãos.

Uma outra parte do edifício foi usada como prisão. Em 1830, o Geeraard de Duivelsteen tornou-se um posto de bombeiros. Perto do final do século 19 foi comprado pelo estado belga para servir como um arquivo nacional. Por causa disso, uma nova ala foi construída.

Curiosamente, desde 2010 o castelo está à venda, devido à sua atual inadequação para o armazenamento dos arquivos do país. Fica a dica para quem quiser morar na casa do Diabo em Gent.

Engraçado que só depois que conheci esse castelo que fui perceber que a cerveja Duvel significa diabo (em dialeto de Antuérpia). Uma boa pedida para acompanhar o almoço, mas não foi essa que pedi estando em Gent. Aproveitei para provar uma que não conhecia, a Keizer Karel Charles Quint, uma cerveja de alta fermentação, bem gostosa. Como o próprio nome diz, essa cerveja foi criada em homenagem ao imperador Carlos V, que era um grande apreciador de cervejas. E que bom para ele que podia tomar cerveja belga todos os dias, rs.

Ali pertinho do castelo, nas costas da Sint Baafskathedraal , encontra-se o monumento em homenagem aos irmãos Van Eyck, esse dois gênios da pintura flamenga.  O monumento foi desenhado pelo escultor Geo Verbanck, falecido em 1961. Sua inauguração ocorreu em 9 de agosto de 1913, na presença do rei Alberto da Bélgica. Bem apropriado para os pintores do Retábulo de Gent e de tantas outras belas obras.

No monumento, os irmãos Jan e Hubert Van Eyck estão recebendo a homenagem dos habitantes da cidade. Homens, mulheres e crianças trazem flores e guirlandas para os pintores. Hubert, o mais velho dos dois irmãos, olha através das páginas da Bíblia enquanto sua paleta e pincéis estão a seus pés, enquanto Jan, olha para frente segurando sua paleta.

Na caminhada em zigue-zague que sempre acabo fazendo, entre o Geeraard de Duivelsteen e o Gravensteen , acabei passando por várias instituições de ensino que me chamaram a atenção. A primeira delas foi a Vlerick Business School,ou simplesmente Vlerick, uma escola particular de business da Bélgica, com campus em Gent, e em outras cidades como Leuven, Bruxelas e São Petersburgo. A escola funciona ali desde 2007, mas o prédio foi construído em 1905 para servir como seminário da maior da diocese da cidade e posteriormente vendido para o município.

Outra construção que me chamou a atenção foi a da Hogeschool. Essa é a maior universidade na região Flandres, com três faculdades, uma Escola de Artes e 13.000 estudantes. Que maravilha que deve ser estudar artes em Gent!

A sua criação em 1995 é o resultado de duas fusões bem sucedidas que envolveram dezesseis instituições de ensino superior belgas. As faculdades atuais estão espalhadas pelo centro da cidade de Gent e Aalst.

E por fim, a última instituição de ensino, cujo prédio salta às vistas, é a De Oogappel, que na verdade é um tipo de escola experiencial, daquelas em que as crianças podem viver, aprender e trabalhar e os processos de aprendizagem e trabalho partem das ideias e experiências das crianças. Me lembra bem o sócio construtivismo e as teorias de Howard Gardner que admiro bastante. Não é à toa que meus filhos mesmo estudam em uma escola que se inspira nas teorias de Gardner e Piaget.

Já chegando no Gravensteen , vemos outra interessante construção do chamado Groot Vleeshuis,edifício usado como Salão de Carne, cujo início da construção data de 1407, sendo concluído somente em 1419. A fachada principal e as fachadas laterais extensas, que se refletem na água, são exemplos interessantes da arquitetura da classe comerciante de Gent. Até hoje o lugar abriga comércio de carnes e outros produtos regionais como presunto típico de Gent, mostarda de Tierenteyn, queijos feitos com cerveja, e claro, uma infinita variedade de cervejas.

Ai que tentação! Melhor continuar caminhando para o Castelo dos Condes.

O Gravensteen, possui um nome mais agradável que o Castelo do Diabo, e é também mais elegante e charmoso, mas uma história mais turbulenta. Resultado da complexa, e por vezes tempestuosa, história política e social da cidade. Ele é o único castelo medieval remanescente com um fosso e um sistema de defesa praticamente intacto na região de Flandres.

Sua história na verdade remonta até aos tempos da ocupação romana, quando já havia um assentamento em um banco de areia pelo rio Lys. Após um breve período de saques vikings, os Condes de Flandres converteram as primeiras construções de madeira em uma fortaleza na Idade Média, com muralhas construídas inteiramente de pedra e repletas de 24 torres.

O imponente prédio com sua arquitetura militar virou então um símbolo do poder dos condes na agitada cidade de Gent.

Infelizmente não consegui entrar no castelo, pois quando cheguei já estava fechando. Isso acontece com quem pára para observar cada prédio interessante que vê pelo caminho em Gent, rs. O simpático segurança, deixou que eu ao menos tirasse fotos da entrada e pátio. Bem, fica para uma próxima visita.

Apesar não ter visitado, o Castelo dos Condes possui em seu interior uma coleção única de equipamentos de tortura. Ele também abriga todos os tipos de atividades culturais, eventos e atividades. Além disso também é um local popular para os moradores de Gent se casarem. Afinal quem nunca quis casar em uma castelo a beira de um rio?

Dá para subir nas suas torres para ter uma boa vista do centro histórico da cidade, bem como das áreas residenciais e industriais.

A região próxima do castelo também é super agradável. Dali saem os passeios de barco pelos canais.  A praça Saint Veerler é repleta de lindas casas que datam do século XVI. Apenas a entrada para o Oude Vismijn é uma exceção a essa regra, já que ele é do século XVII. Sobre a sua  entrada monumental no estilo barroco há uma estátua do deus grego Poseidon, (Netuno para os romanos) com seu tridente e das divindades dos dois rios de Gent, o Leie e o Schelde.

Seu nome significa algo como Velho Mercado de Peixe e ele era exatamente isso, o mercado de peixe, carne e vegetais mais antigo do centro da cidade. Hoje o local abriga um bar, uma brasserie, dois salões de eventos, além do Centro de Informações Turísticas de Gent, que por ironia, só fui entrar no final da minha viagem de bate e volta para essa encantadora cidade.

Hora de pegar o trem de volta para Bruxelas.

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