
Museu do Louvre (parte 3) – um guia para o primeiro andar, desde a Monalisa até os apartamentos de Napoleão III
Nos posts anteriores falamos sobre o Louvre, como chegar e meios de transporte, e depois visitamos o térreo (Rez-du Chaussée), onde estão expostas peças da antiguidade egípcia, grega, romana, etrusca, persa e outras civilizações importantes que fizeram parte da nossa história. Agora chegou a vez de subirmos as escadas e irmos para o primeiro andar.
Na verdade, algumas peças da Antiguidade acabam permeando o primeiro andar também, mas aqui iremos focar nas pinturas europeias e outras obras-primas icônicas. Subindo a monumental escadaria Daru, onde encontra-se a Vitória de Samotrácia, chegamos ao primeiro andar da Ala Denon (lado direito do museu), local ideal para começar nosso passeio pela parte mais célebre do museu, onde estão expostas obras da pintura italiana incluindo a mais famosa de todas, a Mona Lisa.

Começamos pela Grande Galeria, uma longa sala com pintura italiana dos séculos XIII ao XVII. Aqui estão expostas as belíssimas obras de mestres como Giotto, Botticelli, Leonardo Da Vinci, Veronese, Ticiano e Caravaggio. Falando de Da Vinci, a famosérrima Mona Lisa (La Gioconda) está na sala 711A, no fim da Grande Galeria, virando à direita. Prepare-se para encontrar uma multidão tentando visualizar a obra mais famosa de Da Vinci, do Louvre e talvez do mundo.
Vamos parar nossa visita aqui para entender os motivos que fazem a obra ser tão importante. Nessa obra Da Vinci usou uma técnica inovadora de transição suave entre luz e sombra, criando um efeito tridimensional sem contornos nítidos. Isso dá à Mona Lisa uma aparência incrivelmente realista. Outros aspectos que intrigam é o sorriso misterioso, que parece mudar dependendo do ângulo, e o olhar que segue a gente por onde a gente vá. Essa última característica me fazia temer esse quadro quando era criança. Meu pai tinha, e ainda tem, uma cópia no escritório de casa e eu, quando criança, odiava ver a mulher que me seguia com os olhos por onde eu andasse no cômodo, hahaha. Não sabia na época da importância dessa obra.
Dentre as muitas histórias envolvendo a obra, a que mais gosto é aquela que diz que Leonardo nunca entregou a pintura à pessoa que encomendou. Ele a levou consigo até morrer. Será que ele já tinha consciência do valor e importância que a obra teria para a humanidade? Gênio como era, não duvido nada.
Em 1911, a obra foi roubada do Louvre por um italiano patriota que queria devolvê-la à Itália. O desaparecimento virou um escândalo mundial, noticiado por jornais no mundo todo até ser recuperada dois anos depois.
Ainda na sala 700, logo em frente à Mona Lisa está a gigantesca pintura As Bodas de Caná, de Veronese. A obra de 1563, óleo sobre tela, é a maior pintura da coleção, medindo 6,77 metros de altura × 9,94 metros de largura. Considerada Um marco da pintura narrativa, a obra representa o episódio em que Jesus realiza seu primeiro milagre, durante um casamento em Caná a pedido de sua mãe, Maria, transformando água em vinho após este acabar.
No entanto, apesar de representar uma cena bíblica, Veronese usa como cenário a Veneza do século XVI, com sua arquitetura clássica e convidados da alta sociedade renascentista, incluindo músicos, nobres e até figuras contemporâneas da época. O próprio Veronese, Tintoretto e Ticiano estão retratados na parte inferior da obra. Uma licença poética e tanto! mas nas palavras do próprio Veronese “Nós, pintores, tomamos a mesma liberdade que os poetas e os loucos tomam.” Adorei a inclusão dos loucos aqui, se não dá para ser um grande pintor ou magnífico poeta, então que sejamos loucos.
Ainda na Grande Galeria, na sala 710, encontramos as melhores obras da pintura italiana renascentista e barroca como A Virgem das Rochas e São João Batista, ambas de Leonardo, e outras obras de Rafael, Ticiano e Veronese. Eu sou particularmente apaixonada pela pintura de São João Batista. A obra transmite tanta calma e ao mesmo tempo tanta paixão. O olhar enigmático do santo é tanto benevolente quanto desafiador. Dá para ficar muito tempo apreciando a obra e tentando desvendar no final das contas qual a sua mensagem.
Ao final da Grande Galeria, virando à direita chegamos às salas de pinturas francesas dos séculos XVIII e XIX. Dentre as obras podemos citar a belíssima A Balsa da Medusa de Théodore Géricault. De 1819 a pintura óleo sobre tela é baseada no trágico naufrágio real da fragata francesa “Méduse” que em 1816 encalhou na costa do Senegal. Os oficiais então construíram uma jangada improvisada, onde nada menos que cem náufragos se amontoaram. Destes somente 15 sobreviveram à deriva no mar, lutando entre a vida e a morte. Apesar da história tão triste, gosto muito dessa pintura pela dramaticidade e desespero que ela transmite. Na época, uma parte do público ficou chocada com o realismo dos corpos, já que Géricaut havia obtido no hospital vizinho de Beaujon, pedaços de cadáveres incluindo braços, troncos e pernas. Até onde vai a busca dos artistas pela perfeição. Podemos dizer que ele conseguiu seu intento pois é difícil manter a esperança de qualquer salvamento com tantos rostos angustiados.
Outra célebre obra do Romantismo é A Liberdade Guiando o Povo de Delacroix. De 1830, essa magnífica pintura óleo sobre a tela é um ícone do Romantismo, com uso dramático da luz, da cor e da emoção, afinal, nas palavras do próprio Delacroix, ele a “pintou com o sangue do povo”. Como não poderia ser dramática? Além do romantismo, a pintura ainda combina história e politização da arte em um único e impressionante quadro. A obra retrata a Revolução de Julho de 1830, em Paris, quando o povo francês se revoltou contra o rei Carlos X, pondo fim ao seu reinado Nessa obra o personagem que mais me chama a atenção é o garoto ao lado da “Liberdade” com os revólveres na mão. Ele me parece tão deslocado do restante do grupo à esquerda. Reza a lenda que o personagem Gavroche de Os Miseráveis pode ter sido inspirado nele.
Outras obras dessa ala que podemos citar são A Morte de Sardanápalo também de Delacroix, O Juramento dos Horácios do neoclassicista Jacques-Louis David e A Coroação de Napoleão, uma pintura monumental do mesmo autor que retrata o momento em que Napoleão se autoproclama imperador. Uma licença poética também foi permitida aqui já que a mãe de Napoleão, retratada com destaque na pintura, não estava presente na cerimônia, mas foi incluída mesmo assim, a pedido de Napoleão. Este ao ver a magnífica pintura pronta após mais de 10 anos de sua encomenda exclamou “que alívio, que verdade! Isto não é pintura, estamos caminhando na sua pintura”.
Depois da ala Denon, seguimos para a Ala Sully (parte central do museu), com pinturas francesas dos séculos XVII ao XIX e também algumas salas de objetos decorativos, como os apartamentos de Napoleão III e joias da Coroa Francesa
A primeira parada é a luxuosa projetada por Charles Le Brun e finalizada por Eugène Delacroix. Essa sala serviu de protótipo para o Salão dos Espelhos de Versalhes. Uma bela inspiração de fato! É ai que se encontra a coleção de joias da Coroa Francesa como o Diamante Regente, um dos maiores diamante do mundo com 140,64 quilates (28,128 g), a Espada de coroação de Napoleão e muitas Coroas cerimoniais belíssimas cravejadas de muitas pedras preciosas. É proibido tirar foto das peças, tirei uma foto do teto ricamente pintado pelo lado de fora da sala e mesmo assim chamaram minha atenção.
Passando pela galeria chegamos às salas da pintura francesa clássica com obras de Poussin como O Rapto das Sabinas, representando o lendário do rapto das mulheres sabinas pelos romanos. Esse acontecimento em particular foi retratado por inúmeros artistas tanto em pinturas como esculturas. O interessante no caso de Poussin é que ele compôs duas obras sobre o mesmo tema, a primeira de 1634 está exposta no Museu Metropolitano de Arte em Nova York, sendo a do Louvre, de 1637, a segunda versão, com mais personagens e maior dramaticidade, além de um cenário de fundo mais enriquecido que a primeira versão. Isso é que é gostar do tema.
Saimos da Alla Sully e chegamos finalmente na Ala Richelieu (lado esquerdo do Louvre). Aqui na sala 544 podemos contemplar todo o esplendor dos apartamentos de Napoleão III. Lembrando que antes de ser museu, o Louvre era um palácio e nessa ala podemos imaginar um pouquinho do que era a vida imperial de quem tinha como humilde morada esse imenso museu.
Depois de abrigar o Ministro de Estado durante o Segundo Império (1852-1870), os apartamentos tornaram-se sede do Ministério das Finanças, que os ocupou até 1989, quando todo o palácio do Louvre finalmente se tornou um museu. Para a felicidade dos pobres mortais, os apartamentos estão abertos ao público desde 1993.
Ainda na ana Richelieu temos belíssimos objetos de arte decorativos como Virgem e o Menino pertencente à rainha Jeanne d’Evreux, uma escultura gótica de 68 cm feita entre 1324 e 1339.
A escultura foi feita de prata dourada, pedras, pérolas e os mais antigos esmaltes translúcidos franceses.
Ufa! E aqui terminamos nossa jornada pelo primeiro andar do Louvre. Impossível comentar sobre todas as pinturas e obras de arte mas espero ao menos ter inspirado as pessoas a se perderem nesse labirinto rico em arte, cultura e história. No próximo post seguiremos para o segundo e último andar desse grandioso museu.
Para saber mais:

